domingo, 13 de maio de 2012

Que morra de sede o capital especulativo (Emir Sater)

COMENTÁRIO DO PAINEL DO PAIM:

Em 08 de maio de 2009, em nosso livro "Sistemas, Ambiente & Mecanismos de Controle", no capítulo intitulado "Rumo a uma sociedade cibernética", cujo subtítulo é "A mão direita de Adam Smith x mão esquerda do Estado Democrático de Direito", afirmáramos:

" Em tempos de normalidade, a “mão invisível”, de Adam Smith, funciona como um mecanismo de “feedback” negativo: regula o mercado, assegurando o seu estado de equilíbrio (“steady state”) ou homeostasia, ao mesmo tempo em que esse próprio mercado atua como um dispositivo de “feedback” positivo, ao desregular a sociedade e, potencializar o processo espoliativo do neoliberalismo, que garante a persistência desse sistema, no tempo e no espaço.
O mercado, assim regulado, unicamente, pelas suas leis próprias, sem dúvida, atende a racionalidade e os propósitos dos seus donos, porém, ao funcionar, simultaneamente, como um dispositivo de “feedback” positivo, em relação ao restante da sociedade, produz nela, efeitos colaterais nocivos, semelhantes aos de uma empresa extrativa de madeira, cujos lucros ocorrem, ao mesmo tempo, em que impinge enormes danos ao sistema ambiental.
O liberalismo econômico, ao operar mediante a utilização do “feedback” negativo, representado pela lei de oferta e procura, com propósito de regulação do mercado, concomitantemente, desregula a sociedade inteira, através da ação, simultânea, do “feedback”positivo, ampliando, de maneira contínua, a pobreza, a miséria, o desemprego, a fome, a doença e a baixa qualidade de vida da maioria da população planetária, o que incrementa a mortalidade, em todas as faixas etárias, daí resultando diminuição da expectativa de vida, principalmente, nos segmentos mais oprimidos, desfavorecidos e vulneráveis da sociedade.
Mas, esta distorção faz parte, sem dúvida, da própria essência do neoliberalismo e da qual ele é o único beneficiário, além de ser esta, a verdadeira causa da sua sobrevivência.
Este modelo social iníquo persiste mediante a atuação da tal “mão invisível” (com certeza, uma mão direita), que regula o mercado, apenas, através da lei de oferta e procura, ainda que, à custa do restante da sociedade, a qual desequilibra por conta do viés desregulador, dessa própria mão, pouco amiga.
A retroação positiva ou “feedback” positivo é, pois o elemento potencializador do processo espoliativo neoliberal, produzido e mantido através da liberdade do mercado, que opera sem freio e sem rédeas, cuja ação é estimuladora da saída, ao atuar sobre a entrada do processo social, desregulando-o e realimentando um círculo vicioso que multiplica todos os efeitos daninhos desse perverso modelo econômico.
Na retroação positiva, o erro do processo não atua como elemento corretivo, semelhantemente, ao “feedback” negativo, mas ao reverso, ocorre que o sinal de saída é potencializado, reforçado, ampliado, multiplicado, pelo próprio sinal de entrada do processo.
Trata-se, assim, de um mecanismo acelerador.
Ele funciona tal um automóvel sem freio, descendo uma íngreme ladeira, em desabalada carreira.
Em outras palavras: qualquer processo, submetido ao “feedback” positivo, se desregula, dispara, desanda, adquire uma velocidade descontrolada, como ocorreu com a crise do mercado norte-americano, que se tornou global, sistêmica, espalhando seus efeitos pelos cinco continentes.
Todavia, as conseqüências desastrosas para a sociedade, como um todo, verdadeira seqüela do processo econômico liberal, não ocorre apenas em época de crises, como esta, mas persiste em qualquer tempo, correspondendo a um fenômeno endêmico, que atinge e aflige, contínua e permanentemente, a maior parte da sociedade terráquea.
Mas o “diabo” é que, agora, o próprio mercado passou a ser acionado pelo “feedback” positivo e, todas as suas mazelas se multiplicaram e ricochetaram sobre ele mesmo, para a desgraça do neoliberalismo, atingindo-o na “moleira”, tudo desencadeado pela eclosão da crise econômica norte-americana, como conseqüência dos deficientes mecanismos regulatórios do país do norte.
Esta crise se disseminou, velozmente, pelo mundo todo, se tornou sistêmica, ganhou dimensão planetária e desacreditou o modelo liberal, acentuando os seus aspectos nefastos que, mesmo, nos tempos do seu apogeu, infelicita a maioria da humanidade e, cujo único propósito é permitir a satisfação dos interesses da cúpula da sociedade.
Desafortunadamente, Adam Smith não percebeu o fato de que a “mão invisível”, do liberalismo econômico e do capitalismo selvagem, teria a potencialidade de funcionar, também, como mecanismo de “feedback” positivo, não somente em relação à sociedade, mas também, em certas ocasiões, ricocheta sobre o próprio mercado, passível de o desregular, mesmo porque, ele “vive”, sempre, prenhe de contradições internas, gestadas no seu próprio “ventre” e que, agora, estão lhe corroendo as entranhas.
Já Hegel, em sua dialética, antes de Marx, concebera que todo e qualquer sistema constitui uma tese, a qual gera, em seu interior, em seu âmago, contradições, ou seja, a sua antítese, que equivale ao germe que irá destruí-lo, produzindo, então, como resultado dessa luta, entre as partes conflitantes, uma síntese.
Esta síntese representaria, na realidade, outro sistema, resultante da participação de forças antagônicas, que atuam sobre o modelo anterior, mas diferindo tanto dele (tese), quanto da suaantítese.
A seguir, esta síntese se transformará em nova tese, cujas contradições constituirão outra antítese e, do antagonismo deste par dialético, surgirá nova síntese.
Em suma, cada síntese equivalerá a uma nova tese que gerará sua antítese, cujo conflito produzirá outra síntese e, assim, o processo dialético prosseguirá, indefinidamente, nessa sucessão detríades, o que ocorre em relação a todo e qualquer sistema, percorrendo uma trajetória espiralada contínua, capaz de perenizar seu processo evolutivo.
Da seqüência de tríades dialéticas surge, em cada instante, um novo modelo, um novo sistema, embora transitório, porém, mais consentâneo com a realidade do momento considerado, o qual passa a constituir uma nova tese.
O curso dialético é, portanto, inacabado e inacabável, como a marcha da ciência e a trilha da evolução biológica, a qual vem ocorrendo, contínua e permanentemente, com relação a todos os seres vivos e, se verifica, mesmo, com referencia ao processo de funcionamento do organismo humano.
Neste caso, o processo fisiológico decorre do jogo de forças interiores que, em cada instante, produz uma nova síntese, conseqüente das ações contínuas de milhares de mecanismos de “feedbacks” negativos, num esforço constante para se reajustar, instantaneamente, às melhores condições de equilíbrio (steady state) ou homeostasia do organismo inteiro.
À luz da dialética, depois desta crise, o neoliberalismo, jamais, será igual, ao que era antes, uma vez que,, colocado comotese e, suas contradições como antítese, diferente do modelo atual, será a síntese.
A síntese futura será melhor ou pior, tudo na dependência das ações das maiores consciências individuais, atuantes no momento e, dos rumos perseguidos pela consciência coletiva (de âmbito nacional ou internacional), partícipes do atual processo dialético/cibernético.
Como já dizia Heráclito: “Um homem não pode se banhar duas vezes no mesmo rio”.
Na verdade, no instante seguinte, o rio já é diferente, e o homem, também, não é mais o mesmo, pois terá avançado, achando-se em uma nova etapa do seu ciclo vital, correspondendo, então, esse corte transversal de sua trajetória, a outra síntese, no curso da sua existência.
O resgate da humanidade está na dependência do advento de uma nova utopia, representada pela construção de outra ordem social, de uma sociedade diferente, inspirada em um modelo que deverá ser consentâneo com a organização estrutural e com o funcionamento dos organismos vivos e dos ecossistemas naturais, (auto-organizadores, auto-reprodutores e auto-reajustáveis), o qual poderá servir de paradigma para abordar e operar toda e qualquer modalidade de sistemas, sob a égide do cérebro humano e da consciência."


Como afirmamos, inicialmente, este é um trecho do que publicamos, há dius anos e cinco dias, em 08 de maio de 2009, no bojo de nosso livro "Sistemas, Ambiente & Mecanismos de Controle", em capítulo intitulado "Rumo a uma sociedade cibernética", cujo subtítulo é "A mão direita de Adam Smith x mão esquerda do Estado Democrático de Direito", com referência à crise econômica norte americana de 2008 e que se aplica, integralmente, à atual crise européia, iniciada em 2011.




O capítulo mencionado, em sua versão integral, pode ser acessado através do seguinte LINK:


http://campanhapoliticapaineldopaim.blogspot.com.br/2012/05/capitulo-xiii-rumo-uma-sociedade.html




Entretanto, podemos antever que o liberatório pós crise européia não será o mesmo que a conduziu ao atual estado de coisas, caracterizado pela redução do crescimento e até recessão, pelos altos níveis de desemprego e retrocesso das conquistas sociais.

Um dos mecanismos de feedback social é o direito do voto e o povo europeu, através desse instrumento saberá responder aos governantes comprometidos com os interesses neoliberais, a fim de bani-los do cenário político-administrativo, como já está a fazer.


Além da utilização dos postulados cibernéticos, como instrumento de previsibilidade, podemos lançar mão, concomitantemente, da dialética, formulando a seguinte tríade:


Tese: Sistema neoliberal


Antítese: Descontentamento popular


Síntese: Novo modelo econômico-social que designaríamos "Sociedade Cibernética".


Esta utópica sociedade caracterizar-se-ia pela construção de um estado de bem estar social, em que venham a prevalecer os legítimos direitos da maioria do povo, caracterizado pela regulação das atividades econômicas, em contraste com a desregulamentação e estado mínimo, preconizados pelo neoliberalismo e que serve, apenas, a uma hegemônica elite econômico-financeira.


Esta nova utopia, este novo modelo, imune à receitas alienígenas, deverá ser elaborado, não apenas para enfrentar a atual crise econômico-social, mas sobretudo, com o propósito de atender às peculiaridades de cada país e para servir à totalidade aos legítimos direitos do seu povo e, cuja consecução, respaldada pela maioria do voto popular, ocorrerá mediante a ação firme e decidida da mão "esquerda (visível) do estado democrático de direito, em contraposição à mão invisível (direita) de Adam Smith", esta, símbolo nefasto do liberalismo e do neoliberalismo. (Edson Nogueira Paim escreveu)

Este comentário se refere ao seguinte artigo.


Que morra de sede o capital especulativo (Emir Sater)



Originalmente o capital financeiro era um apoio do capital produtivo. Os agricultores tomavam dinheiro emprestado para a colheita, depois devolviam uma parte dos seus ganhos para os emprestadores.

O neoliberalismo teve como sua bandeira central a desregulamentação, a partir do diagnóstico de que a economia tinha deixado de crescer porque haveria excessiva quantidade de normas, que dificultariam os investimentos. Por isso o programa neoliberal pode ser resumido em: desregulamentação, liberalização, para a livre circulação dos capitais. Supostamente os capitais investiriam mais e todos terminariam ganhando, com mais produção, mais emprego, etc.

Não foi o que aconteceu. Porque o capital não é feito para produzir, mas para acumular riqueza. A desregulamentação promoveu uma gigantesca transferência de capitais do setor produtivo ao setor especulativo, onde os capitais ganham muito mais, pagando menos impostos e com liquidez quase total. Esse fenômeno se deu em escala mundial, a ponto de que atualmente mais de 90% dos intercâmbios econômicos não são de produção de bens, mas de compra e venda de papeis, de especulação, que não produz nem bens, nem empregos.

O neoliberalismo promoveu assim a hegemonia do capital financeiro, sob sua forma especulativa. Não a de financiar investimentos produtivos ou pesquisas ou consumo, mas de viver e lucrar da venda e compra de papeis, em detrimento da produção e da geração de empregos.

O poder do capital financeiro, diante de Estados fragilizados pelas aberturas econômicas dos mercados internos, pela financeirizacao das economias, pela desregulamentação econômica, faz com que ele seja o agente fundamental das crises econômicas, que são detonadas como crises financeiras.

Em 2008, a crise atual começou como crise dos bancos. Estes foram salvos pelos Estados. Mas, ao invés de salvarem os países, eles se salvaram a si mesmos. No novo ciclo da mesma crise, iniciado em 2011, os bancos foram agentes da crise e desta vez quebram Estados.

No Brasil, a taxa de juros mais alta do mundo é um obstáculo fundamental para dar continuidade ao ciclo de expansão econômica, com as políticas sociais intrinsecamente vinculadas a ela. Ela atrai o capital especulativo internacional e nacional, com todas as consequências desestabilizadoras sobre nossa economia.

O governo brasileiro está comprometido com que os juros no Brasil cheguem ao nível internacional, deixando de atrair o pior capital para cá. Mas isso não basta, é preciso taxar de forma mais forte a circulação do capital financeiro.

Esse é um enfrentamento antineoliberal central: quebrar a hegemonia do capital especulativo no Brasil. Fazer com que o capital especulativo morra de sede.
Postado por Emir Sader às 16:08

quarta-feira, 9 de maio de 2012


"Caiu do Cavalo": Foi o que aconteceu com Rubens Sardenberg, economista-chefe da federação dos bancos (Febraban) que era conduzida na garupa


QUARTA-FEIRA, 9 DE MAIO DE 2012


O Estado de S. Paulo

Manchete: Bancos vão baixar juros e indicam apoio a Dilma
Ação de Itaú e Bradesco ocorre em meio a polêmica entre Febraban e governo sobre expansão de crédito

Os dois maiores bancos privados do País, Itaú e Bradesco, preparam novas reduções de juros cobrados de empresas e pessoas físicas. A medida é uma forma de demonstrar convergência com a agenda da presidente Dilma Rousseff, um dia depois de mais uma polêmica entre o governo e a Federação Brasileira de Bancos (Febraban). Um documento assinado pelo economista-chefe da entidade, Rubens Sardenberg, colocou em dúvida se a queda de juros resultaria em ampliação de crédito.“Você pode levar um cavalo até a beira do rio, mas não conseguirá obrigá-lo a beber água”, escreveu. A nota causou estranheza no governo, e ontem banqueiros se esforçaram para desfazer o mal-estar - a Febraban disse que a opinião de Sardenberg não era oficial. (Págs. 1 e Economia B1 e B3)

TERÇA-FEIRA, 8 DE MAIO DE 2012


O GLOBO


Manchete: Bancos reagem a Dilma e não garantem crédito maior
Para Febraban, 'cavalo pode ir até a beira do rio sem beber água'

Pela primeira vez desde que foram atacados pela presidente Dilma Rousseff em cadeia nacional por causa dos juros altos e dos spreads, os bancos se pronunciaram. O economista-chefe da federação dos bancos (Febraban), Rubens Sardenberg, disse, em relatório divulgado ontem, que o setor não pode garantir aumento da oferta de crédito, como deseja o governo, para assegurar o crescimento econômico. Sardenberg alfinetou, no mesmo texto: “Alguém já disse que você pode levar um cavalo até a beira do rio, mas não conseguirá obrigá-lo a beber a água.” Procurados, interlocutores de Dilma retrucaram: “Você não pode obrigar um cavalo a beber água, mas ele também 
pode morrer de sede.” (Págs. 1, 19 e 20)

COMENTÁRIO DO BLOG: O cavaleiro "caiu do cavalo" e, no andar da carruagem, são os donos dos Bancos que poderão morrer de sede, embora empanturrados com os juros escorchantes que sempre cobraram, neste país, que pode ser considerado o "Paraíso dos Banqueiros".